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“Todas as pessoas acham que posso exercer uma actividade humilde, desde que não roube. Não é possível que as pessoas me xinguem porque eu chego a ser muito melhor que os desempregados”.​

“Vou-lhe confidenciar um facto. Já degolei várias galinhas para os muçulmanos, mas nunca lhes aconteceu nada de ruim”.​

“Penso que a galinha não guarda boas recordações de mim”

O Mercado do Povo é uma plataforma de contrastes sociais, uma das quais, a luta pela sobrevivência, influencia a vida de Silva Francisco Muchanga, de 21 anos de idade. No seu trabalho – degolar, depenar e vender galinhas – orgulha-se de “tratar” cerca de 150 frangos por dia. Não conhece o nome da sua profissão, mas aceita que o chamemos “o degolador”.

​Silva Francisco Muchanga tem convicções fortes. Na cidade de Maputo, com altos índices de desemprego, o jovem contorna a desonestidade realizando uma actividade humilde, mas digna.

“Sou uma fera na actividade que faço”.

Para muitas pessoas, matar e depenar

galinhas pode ser uma das piores actividades

do mundo.Muchanga realiza-a de forma

estratégica, a fim de atrair os clientes à sua banca.

“O único desafio é ter de acordar muito cedo. Todos os dias, chego às seis e saio às 17 horas do mercado. Não trabalho aos domingos”. “Depenar galinhas é como se fosse ioga. É uma terapia que me relaxa. Depois voltarei para o meu lugar. O meu sonho é ser professor”, diz.

Questionado sobre se pretende mudar de trabalho, Muchanga comenta que “sim, mas não porque a actividade não seja benéfica. Quero ser professor de língua portuguesa. Planeio ingressar no ensino superior a fim de cursar filosofia ou psicologia. Gostaria de ter um emprego que me valha uma vida melhor”. No princípio, o degolador – que já concluiu o ensino secundário – ensinava, a título particular, alunos do ensino primário.

Estes não o compensavam devidamente. Por isso, ainda que os 2.500 meticais mensais que ganha não sejam suficientes, Silva considera que está em melhores condições. “Aqui, eu recebo todo o meu dinheiro de uma só vez e não em parcelas”. É em pessoas como ele que as vendedeiras de comida compram as tripas por um metical e cinquenta centavos por unidade. No entanto, quando os meninos da rua lhe pedem demandam, às vezes ele dá-lhas.

“Todas as pessoas acham que posso exercer uma actividade humilde, desde que não roube. Não é possível que as pessoas me xinguem porque eu chego a ser muito melhor que os desempregados”, afirma o degolador que explica as impressões que as pessoas têm sobre o seu trabalho.

O fervor com que Silva se envolve para matar galinhas é ímpar. O que o marca nessa relação com a ave? “Penso que a galinha não guarda boas recordações de mim. Mas eu tenho boas lembranças dela, porque me tem dado o pão de cada dia”. Interessou-nos o tratamento que se dá aos muçulmanos que compram galinhas depenadas. Eles não admitem que o frango seja degolado por um não muçulmano, devendo-se seguir certos ritos.

Muchanga explica que há jovens islâmicos que por cinco meticais degolam as galinhas se o cliente não puder fazê-lo pessoalmente. Diz Silva: “Vou-lhe confidenciar um facto. Já degolei várias galinhas para os muçulmanos, mas nunca lhes aconteceu nada de ruim”.​


Residente do bairro de Benfica, Silva Francisco Muchanga nasceu a 28 de Fevereiro de 1992. Aprecia o futebol e, em Moçambique, é adepto do Clube de Desportos da Costa do Sol e a nível internacional apoia o Sport Lisboa e Benfica. É solteiro e não tem filhos.



Artigo on-line:

http://www.verdade.co.mz/nacional/36886-penso-que-a-galinha-nao-guarda-boas-recordacoes-de-mim  

 







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